domingo, 2 de março de 2008

uma dobra do tempo

 

daquela vez eu deixaria
na porta de teu prédio
um filme que eu vi
para veres comigo
um pouco de mim
e sonhar junto contigo
um sonho que nunca aconteceu
além desse sonho
que brincamos de construir
sem saber onde ia dar
e faltou acreditar no salto

naquele tempo
eu ficaria acordado
toda aquela madrugada
e passaria por tua janela
voando através das nuvens
de meu quarto solitário
inventaria um tapete mágico
para levar a mim e meus sonhos
até os teus e tua janela

Era assim que eu me encontrava
contigo e perto era tudo que existia

às vezes
eu percorria a cidade à tua procura
eu via em outras pessoas
o reflexo de tua face
de teu rosto que eu nunca vi

ouvia às minhas costas
a tua voz envolvida
em conversas de dias banais

eu vivia para ti
todos os meus minutos
procurava por ti
em todos os meus lugares

eu te via
em todas as histórias de amor
que me contavam os filmes do cinema
e nos poemas de amor
ridículos
como a febre que ardia
em mim
sob a forma de tua presença

tu estavas em todas histórias
eram para ti todas as minhas
pequenas vitórias
simples da vida
ou mesmo as ilusórias

hoje eu soube de um romance de Austen
sob o nome de Persuasão
uma história de amor
e me lembrei de ti
assim
de repente
sem qualquer aviso
ou preparação
tanto tempo depois
quase uma vida depois

senti que o tempo se perdeu
no tempo que se propiciava
todos os sonhos comuns

hoje eu vejo que nem sei teu nome
nem quais outros sonhos que viveste
depois dos meus e dos teus
sonhos que nem sei se sei
não sei se é viva a tua voz
ou incorporou a poeira do tempo

eu não sei se brilha o teu olhar
que mesmo sem ter visto
meus olhos refletidos nele

hoje eu colocaria
em tua posta restante
um pacote bem embalado
toda a arquitetura
de um sonho

porque a emoção me tomou
e eu voltei no tempo

e chamei esse sonho
pelo nome de Amor

e hoje longe
com certeza mais perto da morte
eu ainda me emociono em sentir
o quanto me transformei
e fui além
em nome desse sonho

e que é o único poder
capaz de tal transformação
tão funda
em um ser cansado
da monotonia da vida

só um sonho sublime
tem o poder
de transformar
o ser

senti que
lá longe no tempo
poderíamos
ter atravessado
os umbrais daquele sonho
e construído a realidade
como acabamos construindo
em nossos próprios viéses

não naquele plano
que junto criamos
em sintonia

para a perplexidade
percebo que o medo
da travessia
nos abandonou
cada um
à sua margem do rio
e seguimos
caminhos cada vez mais distantes
daquilo que sonhamos

mas
no entanto
este ficou impresso
em cada alma
de um de nós dois

como uma ternura
esperança vaga
percepção tênue
de uma chama acesa
lá longe
no infinito
 

 


 

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