quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

O Dia Seguinte

Toda renovação - para ser verdadeira - é uma transformação. Toda transformação se baseia no desapego e no abandono de ser. A morte é uma transformação. O amor profundo é uma transformação.

Toda transformação - se consciente - é dolorosa. Porque envolve o rompimento da casca de um ovo e uma abertura para uma dimensão para a qual não temos a menor familiaridade.

O absorver-se no cotidiano - carpe diem - viver o aqui-e-agora, é também uma fuga de si mesmo. Porque o cotidiano é também uma ilusão (maia). Podemos, muito bem, escondermos a consciência de si mesmo vivendo plenamente - e febrilmente - o cotidiano.

Toda alegria e toda tristeza infundadas seriam igualmente idiotas se fôssemos totamente conscientes de nós mesmos. Não somos. Temos apenas vislumbres efêmeros de nosso ser. Há, então, processos e ressonâncias que desconhecemos agindo sobre nosso ser. Processos advindos de contatos intrapessoais e reaçõees do ser no mundo.

O reconhecimento da beleza pode advir tanto da tristeza quanto da felicidade. A melancolia pode ser um estado perceptivo permanente ou provisório. Creio que devemos tratar com respeito e buscar compreensão da dor e da melancolia dos outros, talvez porque no "outro" esteja uma parte de nós mesmos.

O tempo cronológico (cronos) que marca as nossas festas não é uma lei que nos obriga a sermos felizes. O tempo cronológico, bem como as festas, é meramente uma convenção mundana. O que vale é o tempo interno de cada ser (kairós) na busca de sua transcendência (mudança, transformação, renovação) e o que realmente importa é o que cada um sente. Se não corremos o risco de cair num animismo maquínico que nos obrigaria a ser feliz, privando-nos de nossa autonomia de ser.

É o que o mundo quer: que sejamos felizes no momento adequado e tristes nos momentos adequados. E esse adequado é adequado para o mundo e não para nós. Caindo nessa esparrela deixamos de ser sujeito e viramos mero objeto.

Será que aquilo que o mundo nos apresenta é realmente uma perfeita e harmônica razão para nos despreocuparmos da dor que por ventura sentimos? O tempo cronológico, as datas do calendário, mudam realmente alguma coisa em nós?

Será que o abandonar o velho e simplesmente caminharmos, ávidos, leves, livres e soltos em direção ao novo não é a mesma ideologia do descartável vista por uma fantasia de aparente beleza?

7 comentários:


  1. poxa, claudio, adorei esse texto... tem a ver com o que "penso", com o que sinto...

    não vou filosofar, pode deixar... rs

    mas eu não entendi o último questionamento, no último parágrafo, acho que estou interpretando erroneamente:

    Será que o abandonar o velho e simplesmente caminharmos, ávidos, leves, livres e soltos em direção ao novo não é a mesma ideologia do descartável vista por uma fantasia de aparente beleza?

    vc tá dizendo que abandonar o velho (e etc) é a mesma ideologia do descartável?

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  2. Sim,Pav.

    O que eu quero dizer que somos o velho e a renovação não é simplesmente substitutivo do velho e sim uma transformação do velho. E isso não tem data certa para acontecer.

    Concorda?

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  3. claro que concordo!

    isso não tem data certa para acontecer, mas poderíamos deixar acontecer agora... a isso chamo "dar o salto"... rs

    eu ando pela beira do abismo, mas é difícil pular sem o medo... rs

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  4. Mas será que há mesmo o salto?
    Ou apenas uma revolução contínua?

    Eu acredito mais nas coisas contínuas, sabe?

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  5. acho que há as duas opções, claudio...

    acredito que conhecer a si próprio é essa revolução, e há um paradozo inerente a essa questão, se nos conhecermos, veremos que somos novos todos os dias...

    há o salto, há a continuidade, mas a disposição ao novo tem que existir em nós...

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  6. Sim, o conecimento de si é o princípio de tudo.

    Não é à toa que no portal dp Oráculo de Delfos estava inscrita a única mágica que existe: "Conhece-te a ti mesmo."

    Agora, creio que sob determinados estados de espírito estamos sujeitos a mudanças mais bruscas.

    O estado de paixão, por exemplo, é um estado que permite um salto qualitativo... ou, quiçá, uma queda... Será possível uma queda?

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  7. ahahahahaa... bem, quando se trata de paixão, só concebo as quedas!

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