sexta-feira, 13 de março de 2009

[as horas conspiram]





as horas conspiram
para levar-te embora
e eu aqui permaneço
com os olhos parados
pressentindo ausência

a inevitável partida
te levará para longe
e mata expectativas
e sensação do nada
trespassa a agonia

sem reação assisto
teus cabelos serem
levados pelo vento
se uma lágrima cai
apresso-me em secá-la

eu sei... o tempo conta
agora contra mim
sei que tua partida
levará para longe
a única esperança

e eu brinco contigo
de reencontro inevitável
mas sei que te vais
desta vez para sempre
e o infinito me assiste


quarta-feira, 11 de março de 2009

quando eu digo não





quando eu digo não
você não adianta contar
com argumentos
e forças bélicas
porque é melhor morrer
do que voltar atrás

quando eu digo não
é porque morri um pouco
só de antes pensar
em dizê-lo para você
e o irreversível
tomou lugar

quando eu digo não
aconteceu em mim
uma ruptura com o suave
da coisa fluir
é porque cheguei
no limite do tolerável

quando eu digo não
e agora eu te digo
é porque morreu
toda a possibilidade
de ir além daqui
e é melhor sumir



terça-feira, 10 de março de 2009

por culpa de nós dois




um dia você me dirá
de desencontros de amor
e eu direi, que nesse mesmo dia
estava pensando nisso
acontece que o tempo passou
o tempo viveu
e não tivemos tempo
de pensar no que aconteceu

um dia você contará
de encontros de amor
eu direi, que nesse mesmo dia
estava pensando nisso
que o tempo foi pouco
não era uma coisa prática
e havia tanta coisa
para fazer e viver

uns dias depois, você dirá
que tudo não passa de sonho
eu mesmo estava pensando nisso
e então já estou tão velhinho
as palavras já me faltam
e eu não posso pensar mais
que a crueldade da vida
foi culpa de nós dois


de repente, a morte




De repente,
sem qualquer notícia de chegada
eis que a morte me olha
e me escolhe para companhia

"Não morrerás! Diz-me ela.
Padecerás de amargura,
sofrerás todas agruras e mazelas,
Mas não morrerás!
Até que me peças,
por clemência,
que te leve embora comigo."

Assim sendo,
eu com o coração de menino,
marcado pelas rugas
e degeneração de cartilagens,
onde cada passo se torna
um caminhar sobre punhais,
ainda queria viver.

Mas a vida só me reserva
o desterro de mim
numa velhice de todas as dores.

Agora não mais,
dentro da solidão
de todas as cercanias,
sendo cada movimento
de imenso sacrifício,
tendo o coração lancetado
pelas amarguras cotidianas,
e não tendo mais do que
desesperança como sentimento,
eu peço armistício.

Leva-me agora, Senhora,
eu não quero mais.
Já que me vês rastejar
no lodo do poço
em que me encerro.
Não quero mais nada!
Por clemência, leva-me!


ela se vai




eu não tenho coragem
de externar minha tristeza
e nem mesmo demonstrar
o quanto eu estou perdido

eu não posso dizer
que fico feliz
porque ela é diferente
de tudo o que eu vi

ela se vai
e tem mesmo de ir
porque é o tempo
e ela precisa ir

e eu da janela
dos meus tantos anos
não vou chorar
e nem pedir que fique

pelo menos na sua frente
eu vou sorrir
e dizer: eu te amo
mas você tem que ir


o amor e o cotidiano




"Amor permanente... como a gente se agarra nesta ilusão.
Pois se nem o amor pela gente mesmo resiste tanto tempo
sem umas reavaliações. Por isso nos transformamos, temos sede
de aprender, de nos melhorar, de deixar pra trás nossos imensuráveis erros,
nossos achaques, nossos preconceitos, tudo o que fizemos achando
que era certo e hoje condenamos. O amor se infiltra dentro da nós,
mas seguem todos em movimento: você, o amor da sua vida
e o que vocês sentem. Tudo pulsando independentemente,
e passíveis de se desgarrar um do outro.
"
 - sibellepazinato




Eu ainda não sei se concordo com você aqui nesse parágrafo. A questão que me parece mais pertinente aqui é "o que é o amor?". A princípio amor é uma ilusão construída a dois, como bem nos explica Edgar Morin. É um estado de demência consentida. Uma santa demência. Para ter persistência é necessário que a ilusão seja constantemente realimentada. E geralmente as pessoas não têm o menor saco para isso. E talvez estejam certas.

Fato é que uma relação mais permanente é aquela que se se realiza no cotidiano. E é no cotiano, em sua medianidade, que encontramos com o nosso ser, segundo Martin Heidegger em "Ser e Tempo". Assim, se há uma "verdade" ela está no cotidiano. Se falamos em amor como paixão, teremos que afirmar também a sua efemeridade. Porque o estado de paixão não tem nada a ver com a medianidade cotidiana. É um estado de efervecência que nos tira do cotidiano.

A tese da cotidianidade mediana também se observa em casais que convivem muitos anos juntos. Não se deve confundir casamento e amor, pois o casamento é um impulso da paixão que coloca as pessoas em uma relação que tende ao cotidiano. E o cotidiano, quando o verdadeiro ser de cada um se manifesta, pode ser diferente da ilusão da paixão, da demência consentida. Então, há casais que o cotidiano separa e outros casais, também, que o cotidiano revela uma nova descoberta a cada dia. E o efeito disso é a persistência.

Então, eu posso dizer, o amor não será nunca permanente até mesmo para se manter. Ele é uma construção cotidiana em que as coisas se transformam ao longo da vida comum. Se isso não acontece, como falar de amor? O amor só pode ser algo que se revela no cotidiano, se o cotidiano mostra duas pessoas como estranhos conviventes, estaria certo em falar de amor?



o sonho




É irrealizavel porque todo sonho é além do possível.
E, quando damos um passo, o sonho já vai além do que era.

Mas não importa. O que importa é ir ao encontro do sonho.
O importante, o que é realmente importante, não é o sonho.
É sim o caminho.

O caminho que se faz em busca do próprio ser.


o tempo




Do tempo não interessa se existe ou não.
É como Deus.

Do tempo só interessa o seu decurso.


entre você e eu




não sei
o que aconteceu
nada houve de concreto
entre você e eu

os pratos estão por lavar
a cama está por fazer
há uma taça de vinho
que ficou por beber

eu já ia saindo
quando um raio solar
estacou meus passos
e me fez pensar

agora é a chuva que molha
as palavras a dizer
e que seriam bem ditas
e que eu não soube tecer

não sei
que aconteceu
nada houve de concreto
entre você e eu


fé e paixão




Tanto a fé como a paixão são resultados da demência do homem.


[o silêncio marca o compasso]




o silêncio
marca um compasso
lento vazio distante

para onde foram
os sonhos
que nem sonhamos?

tu não resististe
a entregar-te
ao ópio da vida

criaste para ti
um cotidiano falso
fingido de realidade

fugiste tentando
enganar a dor
e não se engana

no meio da noite
a mesma agonia
reclama e te lembra

dentro de ti
está o germe
que és tu


...




Se Deus amou tanto o mundo que mandou seu Filho, não foi porque ele era um péssimo pai, nem porque o filho não tinha se comportado bem.

Foi, então, certamente, porque ele tinha um péssimo gosto.


Quando se morre (era pra ser uma mensagem de fim de ano)




A gente morre, não simplesmente quando para de respirar. Quando o coração já não bate mais. Quando o olhar vidra fitando o infinito. Não! Tem gente que morre muito antes e tem gente que não morre nem quando isso acontece.

Tem gente que morre muito antes de parar de respirar. Tem gente que o coração pára de bater, muito antes do atestado de óbito. Tem gente que morre em vida. Se enterra em vida e nem percebe isso. Quando se entrega ao cotidiano, fingindo ser realidade. Fingindo que é tudo que existe. E cala os sonhos dos possíveis amores e se entrega à penitência diária a cumprir, como se fosse absolutamente necessário percorrer a via crucis, diariamente, cada momento. Como se não houvesse sequer o direito de imaginar um outro caminho seja ele triste ou feliz; encantado ou meramente carnal, sim porque o prazer também faz parte do encanto da vida. Sacrificar o corpo, os sentidos, uma vida melhor. Enterrar-se prematuramente em casamentos insólitos, sem sentido, a uma dependência sórdida e se uma subserviência maquiavélica.

Também é morrer trancar-se no quarto, respirando o ar carregado de todos os dias, sem esperança, sem ao menos poder criar de si uma pequena ilusão passageira que serve de alívio por uns poucos dias, pelo medo de depois retornar ao inferno dos arrependimentos e culpas.

De que vale a vida sem arrependimentos e culpas? Muitas vezes, ainda assim, são as melhores lembranças íntimas de muita gente que eu conheço. Pior daquele que não se arrepende, nem sente culpa, porque sequer fez alguma coisa que valesse, minimamente, um arrependimento ou uma culpa.

De que vale a vida sem o amor? Não aquele amor cotidiano, baseado em trocas, em respeito ou medo, em imposições e sacrifícios. Isso não é amor: é negócio! Não, desculpe-me, não é amor. É morte! É enfurnar-se na caverna da solidão e abdicar da vida. Só será amor quando o sacrifício é das idéias velhas, surradas, puídas, como uma roupa velha que vira pano de chão. Permanecer vestindo essas idéias vencidas o caminho do ser que abre mão de si mesmo, de suas possibilidades, do próprio futuro.

Ensina-nos as religiões sobre os casamentos e seus sacrifícios. Sobre os pecados e a castidade. Ensina-nos a honrar os nossos cônjuges. Ao sacrifício – sempre o sacrifício – da desejo, da vontade, do crescimento pessoal, da felicidade. As religiões ensinam que viver é exatamente isso aí: esse sacrifício. Que merda de vida a religião nos ensina. Que se fodam todas essas religiões que mais massacram do que abrem portas e janelas.

Há pessoas que acreditam que a merda é ouro. E que um dia aquela merda cotidiana de tão pisoteada irá se transformar, por uma alquimia sagrada, em beleza. Enquanto isso deixam que o cotidiano leve todas as esperanças.

Já basta desses dias todos que somos obrigados a aturar a mediocridade dessas coisas cotidianas: trabalho, trânsito, comer mal; aturar a ignorância, a infelicidade, a mediocridade de outros que sequer pedimos para conhecer. E ainda querem, outros, por razões que não são próprias, que nos submetamos ao sacrifício dos sonhos, dos desejos, das vontades que são de cunho personalíssimo, discretamente privado.

Dirão alguns: são regras de convívio, da boa e fecunda convivência. O convívio gera limites. Não me venham com esta! O convívio que me imponha limites que vá para o caralho! Porque, para mim, eu prefiro o convívio que extrapole os limites. Para que serve a convivência cerceadora? No fim das contas nem a convivência vale nada: só os limites é que acontecem.

Hoje eu queria deixar para vocês, meus amigos (apenas os mais chegados) uma mensagem de fim de ano. Acabou virando um manifesto.

Isso é porque eu tenho muitas dúvidas se eu falo com pessoas vivas. Geralmente, os suicidas costumam ter a lucidez de que já morreram havia tanto tempo.

Para essas pessoas que estão mortas eu não desejo nada. Nem os meus respeitos merecem. Quiçá, meus pêsames!

Para aquelas que ainda têm sonhos, que sentem desejos mesmo que pequenos, aqueles que acreditam que o sonho não tem limites e que o sonho é o potencial de uma nova realidade, a esses eu desejo não só um ano, mas dias, minutos e segundos com muitos sonhos e cada vez melhores. Porque o sonho é a única esperança de um futuro melhor. E que a própria morte do corpo, desta velha carcaça-bagaça, não seja um motivo para parar de sonhar.



menina bonita




não se sabe porque
num instante infinito
dois olhares se encontram
e não se explica
como vencem obstáculos
para este encontro
que só pode ser tudo
porque nada já fora